Nesta terça-feira (02/04), Dia Mundial de Conscientização do Autismo, a Comissão de Saúde e Meio Ambiente (Cosmam), da Câmara Municipal de Porto Alegre, realizou reunião para tratar sobre o diagnóstico, o tratamento e a vivência em sociedade das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). A proponente da pauta foi a vereadora Psicóloga Tanise Sabino, que falou da importância do mês de abril para chamar a atenção da sociedade quanto ao TEA. “Eu sou muito feliz em estar aqui no parlamento, como vereadora, como psicóloga, tratando sobre o tema da saúde mental, e quando a gente fala do Transtorno do Espectro Autista, também estamos falando sobre saúde mental, tanto dos autistas mas, principalmente, também das famílias, que necessitam bastante de apoio emocional”, afirmou. A parlamentar apontou ainda a necessidade de criar um outro Centro de Referência do Transtorno Autista (CERTA) infantil no município, além de pensar um novo Centro que abranja o público adulto. Para embasar esta necessidade, Tanise lembrou a Lei de sua autoria sancionada recentemente que determina o censo das pessoas com TEA, que deve indicar inclusive qual a melhor região da capital para abrigar este serviço tão necessário. “Quem define se o novo centro de autismo deverá ser na zona sul ou na zona norte? O censo pode nos mostrar esse caminho”.
A pediatra especializada em neurologia e neuropsicologia infantil, Dra. Fabiana Mugnol, tratou sobre o diagnóstico precoce do autismo e explicou como identificar sinais do TEA. Fabiana abordou a questão do neurodesenvolvimento, que de acordo com ela, começa desde a concepção. Apresentou um gráfico com os picos de desenvolvimento do cérebro e explicou que, no mês zero, o bebê já começa a ter habilidades básicas, como chorar, movimentar, deglutir. “Nessa infância mais precoce, a gente tem o desenvolvimento de grandes habilidades linguísticas, motoras e sensoriais”, explanou. Portanto, o cérebro é plástico e a primeira infância é um momento fundamental para o neurodesenvolvimento. “Em qualquer idade, uma criança que perde habilidades já adquiridas, deve ser avaliada quanto à possibilidade do TEA”, pontuou. A pediatra disse que o diagnóstico para o autismo é clínico e multidisciplinar, sendo indispensável observar as crianças em diversas situações e níveis de complexidade: “o diagnóstico do TEA deve ser feito por uma rede – é isto que torna o autismo único”, ressaltou, lembrando a importância de levar em conta observação não só de profissionais da área da saúde mas também da educação e assistência: “É uma construção totalmente heterogênea, por isso que é tão importante apostar na informação e capacitar toda a rede, na ponta”.
O psiquiatra e coordenador do CERTA, Dr. Alceu Gomes Filho, falou sobre o trabalho do Centro em Porto Alegre, que completa um ano em maio próximo e é hoje de fato uma referência no Brasil por unir educação, assistência e saúde. Alceu reforçou a fala da Dr. Fabiana, indicando que a avaliação precisa ser multidisciplinar para um diagnóstico preciso, o que faz que em alguns casos o fechamento do laudo leve até quatro meses. “De todas crianças que recebemos no CERTA, com laudo inclusive, 10% não são TEA”, disse. Sobre a alta demanda de atendimentos direcionada ao CERTA, Dr. Alceu relatou: “Quando o Certa inaugurou, a nossa capacidade era de 250 crianças. Em três meses, nós recebemos judicialização para 272 crianças. E as ordens do juiz, precisamos cumprir, mesmo que isso signifique passar por cima da lista de priorizações do SUS”. O coordenador do Certa concluiu compartilhando que desde o início do CERTA já foram realizados mais de 8 mil atendimentos e os desafios para este ano são concluir todas as avaliações das crianças, aumentar a sala sensorial, intensificar o trabalho com grupos de pais.
O professor da equipe inclusiva da Secretaria Municipal de Educação (Smed), André Vicente, abordou a inclusão escolar dos alunos do Espectro Autista. Contou um pouco da história da rede da educação inclusiva, que é precursora enquanto política pública, as salas de recursos multifuncionais, por exemplo, são de 2008. “A nossa rede, ela é muito potente”, declarou, e completou citando as salas inclusivas de recursos (SIRs). “Ainda temos o desafio de oferecer uma atenção a toda a multiplicidade de deficiências e as SIRs são uma boa resposta a esta necessidade”.
A jornalista Luciana Mendina, idealizadora da Lei da Detecção Precoce do Autismo, presidente da Associação Inclusiva e autora do “Guia prático do autismo”, deu um depoimento junto ao filho autista Bernardo. Em sua visão, a palavra de ordem em relação ao autismo é união. “Quando o Bernardo foi diagnosticado, havia um autista a cada 150 pessoas, isso há mais de 21 anos, e agora é um a cada 36”, afirmou. Segundo Luciana, a lei que ela idealizou existe desde 2017, mas que deve ser mais divulgado o seu protocolo para avaliação do autismo. “Quanto antes for tratado, mais chance de reverter sintomas”, disse. Por fim, pediu apoio para um projeto que ofereça terapia às mães de autistas, além de viabilizar oportunidades de trabalho para estas mulheres. “Nós não queremos mais leis, nós queremos projetos, queremos concretizar. Viabilizar a vida das famílias atípicas”, declarou.
O estudante de Biologia e autista, Bernardo Martínez, revelou que se beneficiou muito do diagnóstico precoce e que foi observado na escola, por suas professoras. “O Dr. Alceu foi o primeiro médico a me ver e com um ano e onze meses, e receber o diagnóstico tão precoce foi muito positivo.” Bernardo emocionou a plateia, exaltando a importância da persistência de sua mãe ao buscar ajuda para o diagnóstico e depois para os tratamentos necessários e demonstrou empatia com a angustia das mães atípicas: “Como minha mãe relatou, a incidência do autismo cresceu muito, então é compreensível que o CERTA não consiga atender toda a demanda, mas eventos como este aqui mostram que há vontade em ampliar o atendimento e reconhecimento da importância de oferecer este serviço. Gostaria de dizer para todas as mães que não desistam de nós, autistas. Com certeza, vale a pena, eu sou prova disso! Quero agradecer em especial ao Dr. Alceu, que foi quem me diagnosticou, quando eu tinha uma ano e onze meses, e hoje estou cursando a Faculdade de Biologia, sem utilizar as cotas existentes para autistas”, finalizou.
Nos encaminhamentos, a vereadora Psicóloga Tanise Sabino reforçou a importância do debate e lembrou que o mês de abril será especialmente dedicado à escuta e ao diálogo sobre o Transtorno do Espectro Autista e que o trabalho segue no parlamento para que clamores como o de Luciana sejam atendidos: “com mais conquistas concretas e entregas para as famílias atípicas”. Tanise Sabino ainda referiu: “Executivo, Legislativo e as famílias atípicas devem andar juntos, unidos, de mãos dadas. Todos temos os mesmos objetivos: queremos tratamento para os autistas”. A parlamentar aproveitou para divulgar o III Seminário sobre o TEA promovido pela Frente Parlamentar de Saúde Mental, que será realizado no próximo dia 23 de abril na AMRIGS.
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