Um público eclético que tinha em comum a vontade de aprender, entender e acolher lotou o Teatro da Associação Médica do Rio Grande do Sul (AMRIGS)nesta terça-feira, 23 de abril para a realização do III Seminário Autismo em Pauta: diagnóstico, tratamento e inclusão. O evento é uma realização conjunta da Frente Parlamentar de Promoção à Saúde Mental da Câmara de Vereadores, presidida pela Vereadora Psicóloga Tanise Sabino, e da Associação Médica do Rio Grande do Sul e contou com o apoio do SICREDI, da Sociedade de Pediatria do RS, da Associação de Psiquiatria do RS, da Sociedade de Neurologia e Neurocirurgia do RS, da Vortex VR e do Grupo A.
Na abertura do evento o Presidente da AMRIGS, Dr. Gerson Junqueira Junior falou da satisfação da parceria com a Vereadora psicóloga Tanise Sabino: “É o segundo ano consecutivo que realizamos esta série de seminários sobre saúde mental e, desta vez, abordando um tema tão relevante como o autismo. É fundamental que discutamos o assunto de maneira ampla e inclusiva, buscando entender suas nuances e desafios”.
Dando as boas vidas aos presentes, Tanise Sabino compartilhou um pouco de seu trabalho em prol da saúde mental, lembrando a importância da informação como ferramenta de inclusão: “Estamos no abril azul, mês de conscientização sobre o Transtorno do Espectro Autista, mas com certeza o trabalho não se limita a este mês, onde há uma maior visibilidade para este tema. Tenho feito inúmeras palestras ao longo do ano levando informação aescolas, empresas e até mesmo igrejas e vejo o quanto as pessoas precisam conhecer as características e necessidades das pessoas com TEA para que possam acolher e compreender.”
“As pessoas com TEA são parte da sociedade e não à parte da sociedade” frisou o secretário municipal de saúde, Fernando Ritter, na abertura do evento, falando também em nome do prefeito Sebastião Melo. Ritter também parabenizou a inciativa da Vereadora Tanise Sabino em realizar este evento e também em batalhar pela integração educação-saúde, lembrando que assim que conseguiu prover psicólogos para as escolas de rede básica de ensino,já entregou um ofício pedindo psicólogos nos postos de saúde, na atenção primária. “Parabéns pela tua luta em prol da saúde mental, Tanise, e com certeza esta é uma luta de todos nós. Não vamos descansar enquanto todos não estiveram incluídos”.
A primeira painelista da tarde foi a psicóloga Renata Viola, formada em detecção precoce de riscos e transtornos do desenvolvimento que falou sobre a importância do diagnóstico precoce: “Os pesquisadores internacionais estão de acordo que apesar dos fatores de risco iniciais, a trajetória autística não está determinada logo de início; podemos modificá-la com uma intervenção feita muito cedo, quando temos ainda uma grande plasticidade cerebral”, alertou.
O Dr. Alceu Gomes Filho, psiquiatra e diretor do Centro de Referência do Transtorno do Espectro Autista (CERTA) deu sequência ao Seminário falando da vivência do primeiro ano do CERTA: “Lidamos com uma criança que está inserida em um contexto, então é preciso sempre considerar o ambiente no qual ela vive. Atendemos crianças de 0 a 12 anos com uma vulnerabilidade social muito grave. Então, não é só a criança com TEA. São casos de crianças que sofreram negligência, maus tratos, abuso ou algum tipo de inibição social. Então isso traz um outro agravante para os nossos usuários”, descreveu. Ele também lembrou a fala de um de seus professores: “Diagnóstico deve ser no gerúndio, e nunca no particípio passado pois o desenvolvimento deve ser analisadoconstantemente, passo a passo” frisando o porquê da demora nos diagnósticos e elaboração dos planos de tratamento individual. Ao falar dos desafios e conquistas desde a concepção até a implantação do CERTA o Dr. Alceu lembrou a “avalanche” de judicializações que fez com que o número de crianças atendidas ficasse acima doque o CERTA tem estrutura para atender e desorganizasse a lista de priorizações do sistema. Contudo, o Dr. Alceu também compartilhou boas novidades como o grupo de trabalho que já está constituído para que em 2025 Porto Alegre tenha mais uma unidade do CERTA e também o CERTA MAIS – para jovens e adultos acima de 12 anos.
Foi o próprio Dr. Alceu que convidou ao palco do Seminário o próximo painelista, o jovem atípico Nilson Ventura, que fez questão de ressaltar que mesmo ao falar de sua vivência pessoal estava falando em nome de outros jovens como ele: “Todos nós sentimos e precisamos de afeto. O que acontece é que muitas vezes falhamos em demonstrar. Nossa intensidade é diferente e o apego a rotinas e objetos são muito importantes para nós. Isso tudo só tem se tornado mais fácil porque tive suporte”, disse.
Nilson também falou do papel crucial de sua mãe: “ela não se conformou quando os professores disseram que eu era apenas uma criança quieta. Ela me deu sempre muito estímulo, muito suporte, muito apoio”.
O jovem emocionou a plateia com seu relato espontâneo, que incluiu a narrativa de quando foi vítima do próprio “sincericídio” e um exemplo didáticoesclarecendo que cada pessoa – típica ou atípica – é única. Nilson também lembrou o filme “O extraordinário” relatando que todo mundo deveria pelo menos uma vez na vida ser aplaudido de pé e pediu que a plateia fizesse isso com sua mãe, pela sua luta e amor incondicionais. Neste momento os presentes cercaram a Sra. Maria Cristinaconforme a orientação do jovem e a homenagearam com uma demorada salva de palmas.
Na sequência, o médico Josemar Marchezan, neuropediatra, abordou a questão do tratamento do TEA pela ótica da etiologia, destacando a importância de tratamentos individualizadas, já que é um espectro e cada um tem diferentes manifestações. Ele frisou o quanto é importante tratar apenas as características do espectro que causem prejuízo à vida da pessoa atípica, como por exemplo as estereotipias, agressividade e rigidez. Sobre depoimentos distorcidos de pessoas que dizem ter feito a descoberta tardia do TEA, Josemar alertou: “Não existe transtorno sem prejuízo. O diagnóstico do TEA em adultos só pode ser feito olhando para trás: o autismo é um transtorno do desenvolvimento infantil”.
A psiquiatra Ana Cristina Tietzmann foi a penúltima painelista do seminário, falou sobre as comorbidades do TEA: “Precisamos estar atentos as comorbidades pois ao tratarmos os sintomas, oferecemos melhores condições para que os pacientes possam fazer as terapias. Ter os sintomas como alvo, pode ser uma salvação”, destacou Ana. Questionada por uma mãe atípica sobre qual seria o perfil ideal de profissional para acompanhar crianças atípicas nas escolas, a Dra. Ana não hesitou: “professores que não tenham medo de lidar com a saúde mental, pois cada criança é única”. Respondendo ao mesmo questionamento, o Dr. Josemar complementou: “Precisamos de pessoas que queiram verdadeiramente somar a ajudar as crianças, com a supervisão de um profissional capacitado. Um exemplo disso são os próprios pais: não são especialistas, mas são fundamentais para seguir o processo de estímulo ao desenvolvimento definido pelos terapeutas.”
Encerrando o III Seminário Autismo em Pauta, Ana Carolina Rodrigues apresentou o case do “O Diário Azul: Uma jornada através do Autismo”, um projeto que tem como objetivo trazer luz ao tema do autismo, informar melhor a sociedade, diminuir preconceitos, aumentar a empatia e políticas públicas voltadas para a causa.