Na manhã do dia 15 agosto, a Comissão de Saúde e Meio Ambiente (Cosmam), por proposição da Vereadora Psicóloga Tanise Sabino, discutiu o impacto da Resolução 487 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que determina o fechamento dos hospitais de custódia, no caso do Porto Alegre, o Instituto Psiquiátrico Forense (IPF). Tanise Sabino fez um histórico contextualizando a questão e expos sua preocupação diante da resolução, ainda que ela possa constituir uma oportunidade: “atualmente, o tempo de espera para atendimento em saúde mental na rede pública municipal é de 2 anos. Primeiro temos que fortalecer a rede, para depois ter estrutura para abarcar esses pacientes, que na maioria das vezes, são de alta periculosidade. O judiciário precisa estar afinado com a saúde. Esta sintonia anda não existe e precisará ser criada”, apontou Tanise.
A coordenadora da Saúde Mental do Município, Dra. Cristiane Stracke, mostrou-se preocupada com a Resolução 487. “A nossa rede de saúde mental do SUS de Porto Alegre já é insuficiente, com a resolução 487 vai aumentar ainda mais a demanda. Teremos que dar conta destes pacientes que cometeram delitos e que a falta de tratamento aumenta a chance de reincidência. Como garantir que realmente vão acessar a rede de saúde por conta própria, de forma compulsória?”, alertou. Ela ponderou que não é tão simples ampliar a rede para atender à resolução, pois isto exige serviços e custos que não estão previstos no orçamento do município. “Em fevereiro do ano que vem, o IPF terá que fechar as portas, será que todo mundo já terá sido encaminhado lá de dentro? Porto Alegre não pode pagar essa conta por todos que estão no IPF, sendo que a maioria é originário de outros municípios”, afirmou Cristiane.
Representando a Associação de Psiquiatria do RS e psiquiatra do IPF há 29 anos, Pedro Zoratto, avaliou que a Resolução é “completamente ideológica”, que lhe causa estranhamento a ausência de profissionais da área da saúde no grupo que redigiu esta resolução, talvez por isso ela desconsidere a singularidade da pessoa com transtorno mental ter cometido um delito. “A resolução não traz a importância da psiquiatria forense, que faz a interface da psiquiatria com o Direito”, observou. Ele salientou que quem está no IPF precisa de um tratamento individualizado, visando à ressocialização, e a grande dificuldade é o acesso à rede psicossocial, uma vez que muitas cidades do Estado nem sequer tem CAPs”, saliento Zoratto.
A coordenadora da divisão de saúde da Susepe, Paula Carvalho, afirmou: “a questão é nova, mas antiga ao mesmo tempo, porque já estamos vivendo na prática, na SUSEPE, porque desde o dia 8 de junho, com a interdição do IPF estamos sendo obrigados a acolher infratores com doença mental. Se existe uma legislação, estamos buscando alternativas para que seja cumprida. Além disso, dos 195 pacientes do IPF, somente 25 são de Porto Alegre”.
O diretor do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), Dr. Rogério Cardoso, apontou que essa é uma discussão muito antiga no Brasil; em 1921, foi criado, no Rio de Janeiro, o primeiro hospital de custódia e tratamento. “A partir dessa Resolução não tem mais custódia, talvez tenha hospital”, declarou. Ele falou das principais funções do IPF, tais como a perícia, que determina se a pessoa será apenada ou se ficará internada; a atuação no tratamento e nas pesquisas na área. “Nós estamos fechando um Instituto que tem uma efetividade de 70% para colocar esses doentes mentais dentro de um sistema que reabilita 30%. O nome disso, pra mim, é burrice”, criticou. Salientou ainda, que estes pacientes, sem tratamento, podem reincidir nos crimes, devido a patologia.
A integrante da Comissão de Saúde da OAB, Mariana Diefenthaler, destacou a importância da temática: “esta é uma discussão necessária e trata-se de uma questão biopsicossocial e por isso a solução não é puramente jurídica”. Como advogada, destacou que diante da ótica da criminologia a formação do indivíduo começa na família e depois na escola, por isso a importância de falar de saúde mental nestas instâncias e focar na prevenção. “Deveríamos, inclusive, trocar o termo ‘antimanicomial’ por ‘política de saúde’. Precisamos atuar preventivamente com foco nos agentes socializadores. A Vereadora Tanise está de parabéns pelos projetos que tem desenvolvido nesta área”, concluiu a advogada.
Para a defensora pública dirigente do Núcleo de Defesa da Saúde da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul (NUDS – DPE/RS), Liliane Dable, a Resolução peca por faltar técnica psiquiátrica e um estudo aprofundado. “A Defensoria opera com isso, esse debate tinha que ser anterior, buscando uma solução”, afirmou. A procuradora municipal de Porto Alegre, Caroline Lengler, apontou que os serviços são cada vez mais municipalizados, mas que não há verbas correspondentes para a execução. Ela contou que Porto Alegre, na prática, acaba absorvendo demandas de saúde de usuários de outros municípios, inclusive. Portanto, o número deve ser bem maior do que 25 pacientes.
Nos encaminhamentos da reunião, a proponente apontou que a questão da Resolução 487 pode ser uma oportunidade de incremento da rede municipal de saúde. “O que me preocupa é o papel de Porto Alegre. Teremos que dar conta para uma rede que já está saturada”, ponderou.